segunda-feira, 23 de maio de 2011

CARTA ABERTA A SENADORA MARTA SUPLICY



Carta Aberta a Senadora Marta Suplicy
Exma. Sra. Senadora,

Com todo respeito que V. Excelência merece como ser humano e como representante democraticamente eleita de um dos Estados-membros de nossa nação, venho por meio desta questionar e discordar de seus mais recentes pronunciamentos relacionados especificamente com sua defesa da causa homossexual, sobretudo da “criminalização da homofobia”, termo usado frequentemente, embora muito mal empregado, como em breve estarei demonstrando.
Faço isso agora, pois minha Constituição, que estão tentando derrubar, tem me concedido e até me incentivado a participar da vida política de minha nação. Esta mesma Constituição é fruto de batalhas árduas e do sangue de muitos brasileiros que deram sua vida em prol de uma igualdade e de uma liberdade que hoje, pessoas como a senhora e seus aliados, estão, sorrateiramente, tentado retirar de nós brasileiros.

Antes de mais nada, estarei expondo meus argumentos. Tentarei prová-los ao máximo e peço que, caso a Sra. gaste do seu precioso tempo para refutá-los, que o faça pontualmente e, por favor, não se utilize de jargões como “você precisa se atualizar” ou “não é bem assim”. Quem responde com jargões e frases prontas, senadora, atesta sua incapacidade de contra argumentar e quero crer que uma representante do Congresso Nacional do Brasil como é V. Exa., sabe muito bem dialogar, caso contrário, não teria, por tantas vezes, ocupado cargos eletivos neste país.

Depois deste arrazoado inicial, passo a pontuar meus questionamentos, posicionando-me quanto ao que tenho ouvido e visto sobre seu projeto de “criminalização da homofobia” – a PL 122 (as expressões aspeadas são aquelas usadas por V.Exa. num pronunciamento na Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa disponível no site do Senado Federal: http://www.senado.gov.br/noticias/tv/programaListaPadrao.asp?COD_VIDEO=79162

1.      “Milhares de cidadãos” – essa foi a expressão utilizada por V. Exa. Para se referir aos homossexuais em seu discurso. Não obstante, senadora, esse número não parece ser tão grande quanto V.Exa., quis dar a entender. O Censo 2010 do IBGE contou nossa população em 185.712.713 habitantes. A contagem de domicílios totalizou 67.557.424, sendo que apenas 60.000 foram relacionados a pessoas do mesmo sexo. Numa conta de matemática simples, é possível verificar que isso equivale a 0,08% dos domicílios no Brasil. Ou seja, seus “milhares” não chegam a 1%, senadora! Logo, é bom diminuir sua ênfase!

2.      “Os que padecem” – agora não entendi de quem V. Exa. estava falando. Diante de nossa realidade social, que a senadora deve conhecer muito bem, padecimento é uma palavra que deveria ser aplicada aos milhares de brasileiros que se encontram vivendo na miséria e passando fome; àqueles que morrem nos hospitais públicos e postos de saúde à espera de atendimento; àqueles que lutam para sustentar dignamente uma família com esse salário mínimo miserável que lhes é ofertado; aos aposentados que, após anos de contribuição, veem-se obrigados a depender de outros, pois sua aposentadoria mal paga seus medicamentos; às crianças e adolescentes explorados sexual e socialmente. Os exemplos poderiam ser numerosos, uma vez que padecimento é algo vivido por grande parte do povo brasileiro, independente da opção sexual deles.

3.      “Medo de se assumir” – outra expressão estranha. Uma vez que os homossexuais afirmam categoricamente que “já nasceram assim” (declaração com a qual eu discordo, pois não há base científica suficiente para sustentar tal argumento, por mais esforço que se tenha feito para tal), não há o que ser assumido. Ou se é, ou não se é. Quem assume uma postura ou comportamento está representando, disfarçando, simulando. Eu sou mulher, nasci mulher e não precisei assumir isso para ninguém. É fato. E contra fatos, não há argumentos.

4.      “A união estável já está conquistada” – esse foi mais um dos absurdos jurídicos da história desse país! O Supremo Tribunal Federal, guardião da nossa Carta Magna, tratou de rasgá-la ao fazer seu último julgamento. Não há, no texto constitucional, nenhuma brecha para existir tal instituto. A Constituição Federal de 1988 foi taxativa: “Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado. (...) §3º - Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.” (grifo nosso). Não estou afirmando que não pode haver união homoafetiva reconhecida pelo Estado, mas, para que isso ocorresse, deveria ter sido feita uma Emenda Constitucional. O STF, abusando dos poderes que lhe foram outorgados pelo legislador constituinte, legislou contrariamente à Constituição. Logo, apesar dessa vitória da sua causa, senadora, não se vanglorie tanto, pois ela foi conseguida a um preço tão alto que, no futuro, até mesmo a senhora lamentará tal decisão.

5.      “Casamento ninguém está propondo e seria muito difícil passar em qualquer uma das casas” – primeiro, vocês estão propondo, sim! O Dep. Jean Willys, imediatamente após a decisão absurda do STF afirmou que agora lutariam também pelo reconhecimento (casamento) civil homossexual. Se isso não está escrito no seu projeto, é apenas mera questão formal. Segundo, se o direito afirmado por vocês é tão claro e evidente, por que não passaria em nenhuma das casas do Congresso? A Câmara e o Senado não são compostas de representantes da vontade do povo? Então, senadora, nem a senhora acredita que sua causa seja a vontade real da infinita maioria do povo brasileiro, a saber, dos 185.712.713 habitantes desse país.

6.      “Tenho vontade de ouvir a fala das pessoas que são contrárias” – desculpe-me, senadora, mas eu sempre a vejo indo a eventos da comunidade LGBT e se reunindo com eles, mas não me recordo agora de ter visto V. Exa. indo às igrejas, as associações, à instituições das mais diversas existentes no Brasil que sejam manifestamente contra. É cediço, senadora, que é muito mais fácil a Sra. marcar reuniões com esses grupos do que nós termos acesso a V. Exa. Se há tanto interesse de sua parte em nos ouvir, estamos à sua disposição, é só a Sra. avisar publicamente quando e onde e garanto que essas entidades falarão. Minha única dúvida é se a senhora irá gostar do que ouvirá e arriscará perder os votos da comunidade LGBT que sempre lhe elege, justamente, porque nunca são contrariados por V. Exa.

Encerrado seu pronunciamento, passo agora a questionar outros absurdos nessa situação:

7.      Homofobia – não sei se V. Exa. sabe, mas o dicionário define fobia como “Nome genérico das várias espécies de medo mórbido, aversão a alguma coisa.” Com todo respeito, senadora, nenhuma das atitudes que vocês tem mencionado como homofóbicas pode ser classificada como uma espécie de medo mórbido ou aversão a homossexuais. Discordar não é uma fobia.

8.      Criminalização da homofobia – discordar das práticas homossexuais e expressar isso, como dito anteriormente, nada tem a ver com fobia. Portanto, criminalizar a homofobia é algo complicado, pois não há demonstração dessa tal fobia e, mesmo que houvesse, como constituir um crime com base numa patologia? Se ter “medo mórbido ou aversão aos homossexuais” for crime, em pouco tempo, teremos outras patologias sendo criminalizadas e o direito deixará de ser baseado em critérios objetivos, positivados, para ser definitivamente subjetivo, pondo fim, extinguindo, aniquilando qualquer segurança jurídica e toda a construção do direito constitucional, penal e processual feita ao longo da história humana. Para a senhora pode ser apenas uma proteção aos homossexuais, mas, juridicamente, senadora, isso é um precedente de proporções catastróficas.

9.      Proteção do direito à vida, à integridade física etc – esses também foram argumentos utilizados por V. Exa, salvo engano, numa entrevista no congresso nacional, quando uma senadora discutiu com o Dep. Bolsonaro, chamando-o de homofóbico. Se não foi nessa entrevista, perdoe-me, mas foi em um de seus pronunciamentos que a Sra. afirmou que tudo o que eles, os homossexuais, queriam era terem protegidos seus direitos a vida, a integridade física, a ir e vir etc. Não sei onde a Sra. quer chegar, pois, enquanto ainda for vigente o Código Penal e a Constituição Federal, todos esses direitos já estão tutelados e protegem não só os homossexuais defendidos pela senhora, mas todos indivíduo, quer brasileiros ou não, homo ou heterossexuais, de qualquer cor, raça e credo. Assim, sua proposta é redundante e desnecessária.

10.  Proteção contra a discriminação – a Constituição Federal estabeleceu como objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil “IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação”. Assim, senadora, caso V. Exa acredite que há problemas de discriminação no país, crie uma lei que puna a discriminação, mas que seja genérica, como devem ser as leis, e que, como manda a Carta Magna, proteja a todos e não só aos homossexuais. Vale ressaltar, senadora, que os homossexuais não são a única minoria deste país (embora sejam a mais barulhenta) e nem é exclusividade deles serem discriminados. V. Exa. já conversou com negros? Com portadores de deficiência? Com evangélicos, muçulmanos e fiéis de religiões minoritárias? Esse são só alguns exemplos de minorias que sofrem preconceito e discriminação e que nunca foram amparados por leis específicas que os protegessem e que nunca tiveram um parlamentar lutando tão arduamente pela causa deles com tem feito a Sra. pelos homossexuais. Esses são alguns daqueles que a senhora “deveria ouvir”.

11.  Inconstitucionalidade da PL 122 – sem maiores delongas, esse projeto de lei absurdo e extremamente mal redigido viola, fere de morte valores como as liberdades de expressão, consciência, crença e culto. Não sei se a Sra. sabe, mas esse princípios tutelados pelo texto constitucional são cláusulas pétreas, ou seja, não podem ser modificados ou extintos, a CF/88 não admite sequer que sejam propostas emendas que os tente abolir (Art. 60, §4º, IV). E vocês querer exterminá-los com um mero Projeto de Lei? Acho bom V. Exa. consultar sua assessoria jurídica e verá que isso está muito equivocado. No intuito de consertar o mal, a Sra. propôs que nós fôssemos livres para falar contra as práticas homossexuais em ambientes privados. Continuou ferindo os mesmo valores supracitados, pois eles nos foram garantidos para serem expressos privada e publicamente.

12.  Pena mínima de reclusão de 02 anos – os crimes previstos na PL 122, em sua maior parte, possuem pena que impossibilita a aplicação dos benefícios dos crimes de menor potencial ofensivo (pena máxima de 02 anos e mínima não superior a 01 ano), julgados pelos Juizados Especiais, negando também a suspensão condicional do processo (há mais coisas a serem discutidas sobre isso, mas não é o momento nem o meio). Quanto a isso, apenas uma pergunta: a Sra. já calculou quantos presídios terão que ser construídos para atender a demanda de pais de família, trabalhadores, padres, pastores e tantos outros cidadãos até então honestos e dignos, mas que serão condenados à pena de prisão por praticarem atos ou pronunciarem palavras por vocês considerados “homofóbicos”?
O fato é, senadora, que eu creio que V. Exa., seus companheiros de causa e sua assessoria jurídica não estão atentando para esses pequenos pontos que mencionei.

Quero frisar, porém, que não estou contra o direito dos homossexuais de pleitearem aquilo que acham justo (união reconhecida, adoção, benefícios previdenciários etc), por mais que não concorde com a relação homoafetiva por valores pessoais. No entanto, não aceito e nunca aceitarei que o direito pleiteado por eles seja conquistado à custa dos direitos da maioria. Vale a máxima: o direito de um termina onde começa o do outro. E acho bom o deles parar por aqui, pois já está usurpando o meu.

Lutem pelo que vocês acreditam, mas não me penalizem por acreditar diferente e não retirem de mim o direito adquirido de me expressar por palavras e atos.

Termino, senadora, afirmando que, diferente de muitos dos seus companheiros de luta, estou aberta a ouvir seus argumentos e a analisá-los com afinco, tão logo sua resposta me seja enviada.

Desde já, agradeço a disposição de ler minha manifestação e acredito no seu bom senso e no seu julgamento claro e sério da questão.
                                                                                                      Cibele Guerra Farias
Apenas uma voz comum querendo ser ouvida.
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Nota do Darth: Esta carta foi enviada para a Senadora Marta Suplicy (PT/SP) e para todos os demais senadores da República.

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