sexta-feira, 4 de março de 2011

FARSA MORAL DO POLITICAMENTE CORRETO

Por José Carlos Sepúlveda da Fonseca

A maior parte das sociedades modernas cultua como valor básico a liberdade de expressão, pela qual todo e qualquer indivíduo pode manifestar publicamente e sem censuras suas opiniões, desde que estas não incitem ao crime.

Mas, curiosamente, a chamada liberdade de expressão vai sendo corroída não tanto por dispositivos legais mas por uma mentalidade, uma ideologia que se vai disseminando a pouco e pouco. Eu a qualificaria como a ideologia do “anti-preconceito” e da “não-discriminação”.

O leitor já notou que, cada vez mais, diversas opiniões ou atitudes a respeito dos mais variados assuntos (culturais, científicos, políticos, sociológicos, até esportivos) são facilmente qualificadas de preconceituosas ou discriminatórias? E em nome da ideologia do “anti-preconceito” e da “não-discriminação” nosso modo de pensar e de agir é cada vez mais policiado? Policiado socialmente, policiado midiaticamente (se me permitem o termo).

Pode parecer contraditório, mas essa ideologia – e a mentalidade que ela gera – é ela, sim, profundamente discriminatória e cerceadora do direito de expressar idéias, em relação a todos os que não professam seus valores, ou melhor seus contra-valores.

Furor “não discriminatório”Faça um teste! Dê, por exemplo, uma opinião contrária ao “casamento” homossexual, à adoção de crianças por “casais” homossexuais, ou formule um julgamento moral a respeito da homossexualidade e logo verá as patrulhas do pensamento “não discriminatório” se levantarem com furor, brandindo a acusação de homofobia, um epíteto de contornos mal definidos com o qual se pretende voltar a hostilidade pública contra alguém.

Se essa opinião for dada publicamente, com repercussão mediática, o furor “não discriminatório” subirá vários decibéis e contará com a preciosa colaboração de uma parte considerável do jornalismo engajado, que ampliará esse histerismo ideológico.

Estamos em presença do pensamento “politicamente correto”, que se tornou verdadeiramente policialesco em relação ao pensamento e à linguagem.

Alvos selecionados
Mas vejam bem, toda esta máquina de indignação tem seus métodos e metas, tem seus inimigos e cúmplices e escolhe os momentos e os personagens alvos de sua inconformidade.

Há poucos dias Evo Morales, o presidente da Bolívia, em uma de suas investidas anticapitalistas, defendia o “socialismo comunitário em harmonia com a terra”. Em determinado momento, afirmou que o consumo de transgênicos e de frangos alimentados com hormônios femininos causam a calvície, a homossexualidade e a impotência sexual (cfr. Valor e O Estado de S. Paulo 22.abr.2010).

Era de se esperar que o furor anti-homofóbico explodisse internacionalmente. Imagine-se que as afirmações tivessem sido proferidas pelo ex-presidente norte-americano George W. Bush, um alvo preferencial da mídia “politicamente correta”. A gritaria anti-homofóbica teria preenchido os espaços mediáticos, e os leões do pensamento “não discriminatório” teriam rasgado suas vestes em público.

Mas como a afirmação foi feita por Evo Morales, um membro da grei ideológica onde prolifera a ideologia do politicamente correto e onde o ativismo pró-homossexual tem sua guarida, os protestos foram bem minguados e tiveram um eco diminuto na mídia.

Silencioso marxismo cultural
Ao comentar este e outros episódios, o jovem e brilhante jornalista Henrique Raposo, no semanário Expresso de Lisboa (23.abr.2010) respondeu à pergunta: O que é o politicamente correto?

São trechos desse artigo que hoje quero compartilhar com os que acompanham o Radar da Mídia:

  • I. O "Politicamente correto" é, se quiserem, um silencioso marxismo cultural. Se o velho marxismo era uma coisa de massas, este novo marxismo é uma coisa silenciosa. O politicamente correto não é uma ideologia coletiva. É, isso sim, uma crença privada. Mas, atenção, é uma crença privada partilhada, em silêncio, por milhões. É um manual de comportamento e de policiamento do pensamento e do vocabulário.

    II. O velho marxismo assentava numa simples dicotomia moralista: havia os "bons", os operários, e os "maus", os burgueses. O novo marxismo cultural readaptou essa lógica para a esfera cultural, religiosa e étnica: há o "mau", o Ocidente branco, e há o "bom", o resto do mundo não-ocidental. Isto, como é óbvio, gera a farsa moral do politicamente correto. Uma farsa que mina o debate das nossas sociedades.

    III. Um exemplo desta farsa: há dias, Evo Morales disse uma barbaridade: os transgénicos, segundo o Presidente da Bolívia, causam a terrível doença da homossexualidade. Esta declaração, que é um absurdo, não causou polêmica. Os "tolerantes" do costume não reagiram. Se tivesse sido um líder ocidental a dizer semelhante disparate, oh meu Deus, tinha caído o Carmo e a Trindade. Mas como foi um "indígena" da Bolívia, as boas consciências calaram-se. Tal como se calaram perante o racismo de Lula da Silva ("esta crise é da responsabilidade de louros de olhos azuis") ou perante a ignorância criminosa de líderes africanos ("a AIDS é uma invenção ocidental"). Pior: os "tolerantes" são incapazes de criticar a homofobia de Morales, mas já são capazes de me apelidar de "racista" só pelo fato de eu criticar Morales. É esta a hipocrisia vital do chamado "politicamente correto".
  • Extraído do Blog: Radar da Mídia, em 04/03/2011. O artigo foi publicado em 05/05/2010.

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